12 de abril de 2011

Furos no Céu - Lenice Gomes

FUROS NO CÉU

            Houve um tempo em que o Céu e a Terra eram muito próximos um do outro. Diziam que da torre do palácio se podia colher um ramalhete de nuvens, rabiscos de pássaros, carneirinhos saltitando...
            Esta história aconteceu numa aldeia africana. Havia tanta luza naquele dia que duas mulheres pegaram seus pilões para amassar grãos de milho no quintal de casa. Elas diziam amar a claridade e o festejo da lua cheia na aldeia. Tudo era muito mágico.
            Assim, trocavam mexericos e gargalhadas narrando histórias, que as levavam longe, longe. Naquele converseiro o tempo ia passando e as histórias se derramando, feito um rosário de ave-marias. Uma das mulheres, entusiasmada com a conversa, levantou a mão do pilão com tanta força e tão alto, que fez um furo no céu.
            O Céu tomou um susto ao ver aquele furo e desabou a berrar. Elas de tão entretidas nem ouviram, continuaram em sua conversa,  pisando
 nos seus pilões.
            Assim o infinito azul foi ganhando furos e mais furos. Aquelas mulheres jamais imaginavam que seus pilões iam transformando o céu numa grande peneira. O Céu irado, da cor das violetas, gritou mais que um tanto:
            - Aiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii! Uiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!
            O grito chamou a atenção das mulheres, que olharam para o alto e disseram: “Vai chover”. Diziam uma para outra: “Avia, avia, avia... Recolhe o milho e o pilão...” Parecia uma cantoria.
            Indignado, o Céu resolveu ordenar ao tambor em tom de autoridade:
            “Toque alto, por favor”
            Atravesse portas e janelas
            Chegue aos ouvidos das piladeiras
            Convidando-as a me olharem
            Sob as sete luas que as iluminam”.
            Elas, encantadas pelo soar do tambor, aproveitaram para dançar. A cadência foi crescendo, crescendo e crescendo. O Céu achou bonita aquela dança que alegrava o seu universo. Mas nada podia mudar sua decisão de separar-se da terra. Ou subia ou ficava todo furado. Foi subindo, subindo, até chegar num lugar perfeito: nem tão perto que alguém pudesse tocá-lo com a mão do pilão, nem tão alto que ninguém pudesse vê-lo.
            E não que ele sentiu saudades do tum-tum-tum do tambor, do barulho dos grãos no pilão, das histórias das mulheres e de suas canções?! Foi então que o Céu teve a ideia de transformar os furos que as mulheres haviam feio em estrelas, para que pudesse continuar espiando as coisas da terra.
            Satisfeito, o Céu sorriu. E foi contando essa história de aldeia em aldeia, com a intenção de que ela se espalhasse pelo mundo e pudesse ser contada e recontada onde houvesse alguém para escutá-la.
            Assim, segundo os africanos, nasceram as estrelas do céu, pontinhos luminosos no azul, para iluminar a África.







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